Trote estudantil. Entendendo o trote estudantil

Ritual e significados

Os ritos de passagem são costumes adotados por culturas diferentes que carregam significados variados e estão associados a um momento considerado determinante na vida do sujeito. O etnógrafo francês Arnold Van Gennep (1873 – 1957), dedicou-se ao estudo de ritos de passagem de diferentes culturas e seus significados. Van Gennep definiu-os como eventos tradicionais que marcam mudança de status ou de condição de um grupo ou indivíduo perante sua comunidade. Nessa perspectiva, o trote universitário é um ritual de passagem que marca a separação entre a escola e as representações que ela carreg a, a entrada na vida universitária, que acaba por ser entendida como a passagem para a vida adulta para os mais jovens, e da conquista que representa o ingresso no ensino superior.

O trote é geralmente aplicado no momento de entrada dos novos estudantes, que passam a ser referidos como “calouros”. Os variados significados do ritual podem ser entendidos como uma forma de separação entre os alunos veteranos, que já se sentem em posição superior àqueles que acabam de entrar no mundo universitário; ou como forma de demonstração da inferioridade daquilo que o “calouro” é e representa, o sujeito que vem de fora do mundo universitário, que deverá ser “iluminado” pelo conhecimento acadêmico que receberá no decorrer de sua vida universitária. Trata-se também de um momento de autoafirmação daqueles que, assim como os novos calouros, também se submeteram ao ritual de passagem e que agora desejam se reconhecer e serem reconhecidos como “veteranos”. Dentro do mundo de significados adotados por aqueles que se submetem ao ritual, o trote passa a ser um ponto de divisão entre uma fase de separação e uma fase de incorporação do indivíduo ao novo grupo

Trote e violência

O trote, embora tenha seu significado para aqueles que participam do ritual, passa a ser um problema na medida em que seus participantes passam a adotar práticas violentas e destrutivas. Há também, em algumas comunidades acadêmicas, a coerção para que os calouros participem do trote, sob a ameaça da exclusão ou do isolamento daqueles que não aceitaram se submeter ao ritual. Casos de lesão corporal ou mesmo de morte se tornaram comuns, o que levou ao questionamento da forma como os trotes são feitos.

Hoje, a forte campanha de conscientização quanto ao trote violento surtiu efeito sobre a forma como ele é realizado. O trote solidário, que consiste na arrecadação de alimentos ou na prestação de serviços comunitários por parte dos calouros e dos veteranos em conjunto, é cada vez mais adotado. O caráter coercitivo também acabou por desaparecer na maioria dos casos, embora ainda existam comunidades que ainda mantenham o rito de passagem como tradição.

Embora seja ainda encarado como um momento importante e significativo na vida do jovem que deseja passar pelo trote, é de extrema importância ressaltar que o indivíduo não tem e não deve se submeter a formas violentas, humilhantes ou destrutivas do costume. Existem inúmeras formas de celebrar a nova fase da vida, a violência, no entanto, é absolutamente desnecessária.

GENNEP, A. V. Os ritos de passagem. 2. ed., Trad. Mariano Ferreira. Petrópolis: Vozes, 2011.  

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