O movimento sufragista reivindicou os direitos políticos para as mulheres, mais especificamente, o direito de votar e de ser votada. Surgiu na Inglaterra, no século XIX, e alcançou o mundo no século XX, período em que a reivindicação foi atendida pela maioria dos países.
É importante observar que pode existir uma disparidade entre o período em que se conquista o direito ao voto e o de eleger-se. Há também diferenças na amplitude do sufrágio em relação à escolaridade, renda e cor, restrições que, em muitos casos, foram derrubadas anos depois da sanção do voto feminino.
Hoje, em que a ampliação dos direitos políticos ocorreu em diversas partes do mundo, ainda há sub-representação das mulheres nos parlamentos e no poder Executivo, o que demonstra um longo caminho a ser percorrido.
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Tópicos deste artigo
Resumo sobre o movimento sufragista
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Ocorreu nos séculos XIX e XX.
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Sua principal reivindicação era a garantia às mulheres do direito a votar e ser votada.
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O país que o protagonizou foi a Inglaterra.
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Seus métodos de militância iam desde artigos de jornal, conferências, propagandas, pressão ao Parlamento, manifestações pacíficas até, no caso das suffragettes britânicas, atos violentos.
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No Brasil, o direito ao voto feminino foi sancionado em 1932, no governo Getúlio Vargas.
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Sua grande referência brasileira foi a bióloga e feminista Bertha Lutz.
História das sufragistas
O movimento reivindicatório pelo voto feminino desenvolveu-se no contexto da chamada primeira onda do feminismo, junto a outras reivindicações por direitos políticos, sociais e jurídicos, na segunda metade do século XIX.
Num contexto de consolidação dos Estados modernos, numa Europa marcada pelas profundas mudanças políticas, culturais e sociais, especialmente no mundo do trabalho, fomentadas pela Revolução Francesa e pela Revolução Industrial, o grupo de ativistas femininistas que protagonizou a primeira onda buscava igualdade jurídica entre mulheres e homens no campo da educação e das posses, o direito ao divórcio e o direito ao voto. Este último foi a grande bandeira que caracterizou o movimento naquele período.
As feministas da primeira onda são denominadas feministas liberais. Eram mulheres de classe média e classe média alta. As mulheres de classe média alta, donas de propriedades, tinham como força motriz de suas reivindicações não serem oprimidas pelos homens de sua classe removendo-se as diferenças entre elas e os homens que também possuíam propriedades.
Já as mulheres pobres que trabalhavam nas fábricas em jornadas exaustivas, em condições precárias e por baixíssimos salários, trabalhavam fora e deixavam os filhos em casa, tinham dupla jornada por também realizarem os serviços domésticos, tinham outra vivência e ponto de partida para lutarem por direitos.
De toda forma, o movimento sufragista uniu diferentes grupos de mulheres, de diferentes classes sociais, diferentes graus de instrução e com diferentes pautas, pois todas tinham uma experiência em comum: a exclusão dos direitos políticos. Essa exclusão interferia no alcance de seus objetivos, fossem eles relacionados à administração de posses, à educação formal, ao divórcio ou a melhores condições de vida e trabalho. O direito ao voto e de ser votada era, antes de tudo, um reconhecimento da cidadania das mulheres.
Na Inglaterra, Mary Wallstone Craft publicou, em 1792, o artigo “Reivindicação dos direitos da mulher”. Ela e outras teóricas publicaram diversos textos advogando pela participação política feminina e também pelo amplo acesso de mulheres à educação formal. A educadora Millicent Fawcett fundou, em 1897, a União Nacional Pelo Sufrágio, importante agremiação pela luta sufragista. No Reino Unido, a luta sufragista aliou-se à pauta do movimento operário contra a exploração de trabalhadoras.
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Em 1903, as suffragettes fundaram a agremiação Women’s Social and Political Union, cuja grande líder era Emmeline Pankhurst, e os principais métodos de militância eram propaganda, desobediência civil, atividades não violentas e, posteriormente, atividades violentas. Esse grupo exerceu imensa influência sobre outros movimentos de mulheres no mundo ocidental. As suffragettes, lideradas por Emmeline Pankhurst, eram uma dissidência do movimento britânico sufragista pacífico. Com o lema “Ações, não palavras”, elas realizam atos de violência política e estavam dispostas a serem presas e mortas pela causa.
O evento que marcou a luta sufragista e foi um dos seus principais propagadores da Inglaterra para o mundo ocorreu em 1913, quando uma professora chamada Emily Davison jogou-se na frente do cavalo do rei Jorge V durante uma corrida, o que causou sua morte, tornando-a mártir do movimento sufragista. O movimento espalhou-se por outros países da Europa e chegou também aos Estados Unidos, onde recebeu um novo fôlego de alcance mundial.
O primeiro país a garantir o direito ao voto para as mulheres foi a Nova Zelândia, em 1893, a maior líder sufragista foi a feminista Kate Sheppard, e uma das principais pautas que estimulou o interesse das mulheres pela política era a legislação sobre controle no uso de bebidas alcoólicas no país, com o objetivo de acabar com a violência doméstica por homens bêbados.
O segundo país foi a Finlândia, em 1906, que teve as primeiras parlamentares eleitas no pleito seguinte. A Inglaterra, grande protagonista do movimento sufragista, teve o direito ao voto feminino alcançado em 1918, após a Primeira Guerra Mundial, e apenas por mulheres donas de propriedade. O sufrágio universal na Inglaterra só se concretizaria 10 anos depois (1928). O último país a garantir o direito ao voto feminino foi a Arábia Saudita, em 2015.
Atuação no movimento sufragista
A atuação das participantes do movimento sufragista incluía diversas atividades:
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publicações na imprensa
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conferências
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reuniões políticas
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tentativas de negociação nos parlamentos
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manifestações pacíficas
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desobediência civil
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disputas judiciais
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protestos violentos
A tentativa de inibir e constranger as mulheres a conformarem-se exclusivamente com o seu papel no ambiente doméstico era marcada pela difusão da ideia de que elas seriam incapazes de exercer liderança e administrar coisas públicas, pois seriam muito emotivas e pouco racionais. A coação e intimidação ocorriam em diversas frentes, desde charges e anedotas na imprensa até repressão violenta e prisão. Algumas líderes do movimento sufragista, como Emmeline Pankhurst, foram presas diversas vezes.
Quais as reivindicações das sufragistas?
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Movimento sufragista de 1920
A primeira Marcha das Mulheres em Washington pelo direito ao voto, que aconteceu em 3 de março de 1913, é um marco histórico do surgimento do movimento feminista nos Estados Unidos. As norte-americanas e, principalmente, as britânicas protagonizaram esse movimento que se espalhou pelo mundo. Tal luta estendeu-se por décadas e sofreu muita resistência, tanto da classe política quanto da sociedade da época. Acreditava-se que a expansão dos direitos femininos abalaria a instituição da família.
Nos Estados Unidos, a luta sufragista também se combinou com a luta contra a escravidão. Harriet Tubman, conhecida como Black Moses, foi uma afro-americana abolicionista que conduziu muitos escravizados à liberdade e foi uma das grandes oradoras do movimento sufragista norte-americano. No entanto, havia uma resistência por parte de sufragistas brancas da região sul, tanto que, nos protestos de 1913, as mulheres negras foram compelidas por Alice Paul, uma das líderes da marcha, a ficarem no final do ato.
Nos Estados Unidos, o voto feminino foi aprovado em 1920, embora mulheres pudessem candidatar-se desde 1788. A conquista do direito ao voto por mulheres e homens negros só se concretizou em todos os estados norte-americanos em 1960.
Movimento sufragista no Brasil
As primeiras reivindicações pelo voto feminino no Brasil remontam ao Império. Em 1932 Nísia Floresta publicou o artigo “Direitos das mulheres e injustiças dos homens”, em que defendia o acesso igualitário à educação e aos direitos políticos. No Brasil republicano, a primeira associação feminina de busca por direitos políticos foi fundada, em 1910, na capital federal à época, Rio de Janeiro. Sua líder era a professora e indigenista Leolinda de Figueiredo Daltro, o nome da agremiação era Partido Republicano Feminino.
Na década de 1920, foi fundada uma segunda associação, a Liga pela Emancipação Intelectual da Mulher, que mais tarde seria renomeada como Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF). Sua principal líder, Bertha Lutz, aliou-se ao movimento feminista internacional. Manteve contato por meio de cartas com Carrie Chapman Catt, uma das principais líderes sufragistas, de quem recebia conselhos.
Essa aproximação tinha o intuito, também, de fortalecer e respaldar a agremiação no cenário nacional. O principal propósito dessa associação era: “assegurar à mulher os direitos políticos que a nossa Constituição lhe confere e prepará-la para o exercício inteligente desses direitos”|1|.
Desde 1917 chegavam ao Parlamento brasileiro algumas propostas de lei e emendas constitucionais em favor do voto feminino. Dentro do Parlamento, o principal aliado da causa, que mantinha contato com Bertha Luz e seu grupo, era o senador, pelo Rio Grande do Norte, Juvenal Lamartine.
Este, ao assumir o cargo de governador de seu estado, em 1927, estendeu o direito ao voto às mulheres do Rio Grande do Norte, o primeiro estado do Brasil a aprovar o voto feminino. Nesse estado foi eleita a primeira prefeita, Alzira Soriano, na cidade de Lajes, em 1928. Curiosamente, o Rio Grande do Norte é o único estado brasileiro que, após a redemocratização em 1985, elegeu três mulheres como governadoras, o que representa um terço do total de governadores pós-redemocratização.
A partir de 1927, a atuação do movimento sufragista, especialmente da FBPF, intensificou-se. Assim, a agremiação promoveu palestras, propagandas em rádio, artigos para a imprensa, entregou cartas a parlamentares, distribuiu panfletos no Senado e na Câmara, porém, ainda, não alcançando seu objetivo. Desse modo, a associação passou a oferecer assessoria jurídica às suas participantes, para que se alistassem como eleitoras, e a divulgar os pareceres favoráveis.
Em 1930, Getúlio Vargas designou uma subcomissão legislativa para propor a reforma da lei eleitoral. Assim como a FBPF, liderada por Bertha Lutz, outras duas associações dissidentes dela, Associação Feminina Batalhão João Pessoa (MG), liderada por Elvira Komel, e Aliança Nacional das Mulheres (RJ), comandada por Nathércia da Cunha Silveira, atuaram para que o voto feminino fosse aprovado na reforma. Elas promoveram dois congressos femininos em que discutiram a inserção feminina na política e entregaram as deliberações dos encontros ao Governo Federal.
No primeiro esboço da nova lei eleitoral, em 1931, foi proposto pela subcomissão que o voto feminino fosse restrito a mulheres que tivessem renda, assim, solteiras dependentes financeiramente ou casadas que fossem donas de casa estariam fora da proposta. As sufragistas protestaram, realizaram conferências e levaram suas deliberações à subcomissão eleitoral, marcaram reuniões com políticos, participaram de sessões do Congresso, e enviaram telegramas a parlamentares.
Essa pressão deu certo, em parte. Com a aprovação da nova lei eleitoral em 1932, todas as mulheres brasileiras, maiores de 21 anos, alfabetizadas e assalariadas, passaram a ter o direito ao voto. O sufrágio para todas as mulheres ocorreu em 1965, e para pessoas analfabetas, em 1985.
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Movimento sufragista na França
A França foi o primeiro país a instituir o sufrágio universal masculino, mas foi um dos últimos países da Europa a instituir o sufrágio universal feminino. Esse país teve uma participação pioneira na luta pela universalização dos direitos civis. É o país da Revolução Francesa (1789), que destituiu a monarquia absolutista e impulsionou movimentos democráticos em todo o mundo. É também o país da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1758), que inspirou líderes do movimento feminista e de outros movimentos por direitos.
No entanto, durante a Revolução Francesa, as mulheres foram excluídas do direito ao voto, eram chamadas de “cidadãs passivas”, e alguns argumentavam que a religiosidade de muitas seria incompatível com o ideal de Estado laico, além da clássica justificativa de que a mulher votar destruiria as bases da família.
A feminista francesa Olympe de Gouges elaborou, em 1791, a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã como resposta ao primeiro documento, que excluía mulheres dos direitos civis, e, por conta disto, foi decapitada. As francesas votaram pela primeira vez em 29 de abril de 1945, na primeira eleição após a Segunda Guerra Mundial.
Nota
|1| KARAWEJCZYK, Mônica. O voto feminino no Brasil.