Em sua obra intitulada O Povo Brasileiro, o antropólogo Darcy Ribeiro afirma que “apesar da associação da pobreza com a negritude, as diferenças profundas que separam e opõem os brasileiros em extratos flagrantemente contrastantes são de natureza social”. (RIBEIRO, 2006, p. 215). Isso sugere que, para além do preconceito racial tão discutido no Brasil, há outro que está pautado na posição social dos indivíduos, conforme seu acesso à renda, poder aquisitivo, padrão de vida e nível de escolaridade. Em outras palavras, no Brasil também existe o chamado preconceito de classe social.
Ao falarmos em classe social na sociologia, automaticamente somos impelidos a pensar na obra de Karl Marx, o qual, ao fazer uma crítica ao capitalismo, afirma que a sociedade capitalista seria divida em classes sociais, uma proletária e outra burguesa. Em linhas gerais, a primeira seria responsável pela força de trabalho enquanto a segunda seria dona dos meios de produção. Isso seria característico da sociedade capitalista, sendo um fator determinante da diferença social, principalmente no que tange à possibilidade do acesso aos resultados da produção capitalista (os bens de maneira geral), fato que contribuiria para aumentar a desigualdade social.
Contudo, quando falamos em classe social para pensarmos esse determinado tipo de preconceito, não devemos considerar apenas esse sentido visto em Marx, o qual pressupõe a existência de uma constante luta de classes com interesses antagônicos na sociedade capitalista (o que não deixa de ser importante). Deve-se falar em classe social em sentido mais amplo, considerando os diversos grupos sociais numa classificação socioeconômica, sua posição ou status na estrutura social, fato que sugere a existência não apenas de duas classes, mas de tantas outras a depender de aspectos como níveis de renda, de escolaridade, de acesso à assistência médica, entre outros fatores.
Em outras palavras, devemos pensar a ideia de preconceito de classe social para além da chave burguês/proletário, considerando a existência de classes mais abastadas economicamente (milionários, ricos, classe média alta) e outras com menos recursos (classe média, média baixa, pobres, miseráveis), sendo a renda o fator determinante de sua posição social e, dessa forma, do preconceito de classe.
Essa breve observação é importante uma vez que podemos encontrar trabalhadores urbanos que, embora sejam todos proletários, por possuírem faixas de renda diferentes, podem manifestar preconceito de classe em relação aos que possuem um status inferior em relação ao poder aquisitivo, seja por ocuparem funções inferiores, seja por terem menor grau de instrução. Naturalmente, a possibilidade do preconceito dos mais ricos (donos de meios de produção, empresários, banqueiros) em relação aos mais pobres estaria mais próxima desse antagonismo de classes tão discutido por Marx.
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Para se ter uma ideia, em 2011, na cidade de São Paulo, houve uma polêmica quanto à construção de uma estação de metrô em uma região nobre, mais precisamente no bairro de Higienópolis. Moradores dessa localidade manifestaram-se contra as obras pelo simples fato de temerem a presença de pessoas “estranhas” pelas redondezas, alegando que a estação de metrô colocaria em risco a segurança e a tranquilidade locais. A polêmica gerada ganhou o noticiário, pois, apesar da coerência do argumento em relação aos possíveis reflexos na região como o aumento do número de transeuntes, tratava-se de um ponto de vista preconceituoso em relação à grande massa trabalhadora usuária desse tipo de transporte público. Mais do que isso, esse discurso (talvez não de uma maioria, mas de um grupo de moradores) deixaria implícita a tentativa de uma “demarcação territorial” por uma determinada classe desejosa em se manter isolada, longe do que lhe parece inferior.
Como qualquer outro tipo de preconceito, este, motivado pela situação econômica, também se manifesta como um tipo de violência, da mesma forma que aquele dado pela cor da pele, tão comum à sociedade brasileira. Aliás, para Darcy Ribeiro, “não é como negros que eles operam no quadro social, mas como integrantes das camadas pobres, mobilizáveis todas por iguais aspirações de progresso econômico e social […]. Acresce, ainda, que […] mais do que preconceitos de raça ou de cor, têm os brasileiros arraigado preconceito de classe”. (ibidem, p. 216).
Dessa forma, o que se pode compreender é que para além dos problemas sociais e econômicos dados pela desigualdade social gerada pela divisão do trabalho na sociedade capitalista, a discriminação social vem ampliar as dificuldades encontradas pelos mais pobres.
Paulo Silvino Ribeiro
Colaborador
Bacharel em Ciências Sociais pela UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
Mestre em Sociologia pela UNESP – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”
Doutorando em Sociologia pela UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
Sociologia –