O nacionalismo

Um dos fenômenos sociais recentes mais problematizados pelas disciplinas das Ciências Sociais é o nacionalismo, bem como os movimentos oriundos deste. Isso não acontece por acaso, pois, afinal de contas, a nação à qual pertencemos é geralmente a primeira forma que utilizamos para nos identificar quando estamos em outro país, não é verdade? O nacionalismo, portanto, de forma resumida, seria o sentimento de pertencimento de um sujeito a um grupo tanto por proximidade quanto por vínculo racial, linguístico ou histórico. Assim sendo, trata-se de uma ideologia que exalta o Estado nacional ao qual pertence o indivíduo em detrimento da imagem do que é estrangeiro.

Não é por acaso que alguns dos movimentos sociais mais importantes do mundo atual sejam nacionalistas. Sua força de mobilização em torno de interesses do grupo representado pela ideia da nacionalidade é sempre grande justamente porque é grande o poder generalizador que a identidade nacional possui. Entretanto, para os autores Karl Marx e Max Weber, o nacionalismo seria um fenômeno altamente destrutivo e de alcance bastante limitado. Eles acreditavam que, com o crescimento das economias capitalistas e a consequente integração que esse sistema exigia, o sentimento nacionalista gradualmente deixaria de existir em função da priorização do lucro, o que estimularia uma integração cada vez maior a ponto de as barreiras nacionais tornarem-se apenas obstáculos no caminho do “progresso” econômico.

Embora Weber tenha dedicado grande parte de seus estudos para as questões da nacionalidade, nem mesmo ele conseguiu antever a dimensão que o nacionalismo tomaria em nosso mundo contemporâneo. O cenário geopolítico e econômico atual é a evidência que mostra o quão profunda é a influência do ideal nacionalista em nossa realidade. As disputas territoriais, embora não sejam de maneira alguma novidade, não mais se travam apenas no campo de batalha físico. O sentimento de união que a ideia de nação permite, ocasiona a confluência de grupos que se identificam com a mesma construção de nacionalidade. O resultado é que mesmo que não possuam o reconhecimento ou tenham perdido seu reconhecimento formal de Estado-nação dos outros países, ou tenham sido conquistados por forças estrangeiras, a identidade comum de uma nacionalidade, ou o sentimento de pertencer a uma nação, permanece. Exemplo disso são os conflitos que ainda se desenrolam entre Israel e Palestina, em que o último não é reconhecido como uma nação ou país legítimo por um grande número de países, mas sua população mesmo assim se mantém unida, reconhece-se e identifica-se com uma identidade nacional.

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Ernest Gellner (1925-1995) talvez seja o teórico mais reconhecido que tratou sobre a questão do nacionalismo. Para ele, a ideia de nação, o nacionalismo e o Estado-nação são adventos da civilização moderna que tiveram origem na Revolução Industrial do fim do século XVIII. O nacionalismo seria, então, produto da nova sociedade de produção em massa que o industrialismo fundamentava. Gellner defendeu que o sentimento de nacionalismo não existia nas sociedades tradicionais, assim como a ideia de nação, tal como é concebida hoje.

Para Ernest Gellner, entre as possíveis razões para o surgimento da noção de nacionalismo, estava a complexidade do sistema econômico industrializado, que fez surgir a necessidade da construção de sistemas de Estado e Governo muito mais eficazes que os anteriores. Outro fator era a convivência cada vez maior com um enorme número de pessoas diferentes, uma vez que o centro de convivência do sujeito não era mais uma comunidade pequena e isolada, por exemplo, mas, sim, as grandes cidades superpovoadas, fortemente conectadas e muito mais acessíveis. Todavia, como fator mais preponderante, a construção de uma educação massificada, fundamentada em uma única “língua oficial” que seria ensinada nas escolas, foi a maior responsável pela manutenção de uma sociedade unificada e organizada como as que observamos hoje.

Entretanto, embora trate de pontos fundamentais da questão do nacionalismo, o trabalho de Ernest Gellner é criticado por seu cunho funcionalista. A visão de que a escola é produtora de unidade nacional é ainda debatida fortemente, uma vez que o processo educativo não apenas incute parâmetros de conciliação entre os indivíduos, mas é também um palco onde se desenrolam grandes conflitos sociais. Muito além disso, é ainda preciso considerar a relação que a nacionalidade possui com a construção da identidade dos sujeitos, ainda que esses não passem por instituições de educação formal.

A ideia de etnia é comumente vista nos estudos sobre nacionalismo mais recentes. O autor Anthony Smith afirma que a construção da identidade nacional está diretamente ligada à constituição étnica do grupo em questão, o que não se limita ao período de tempo do início da modernidade. O exemplo dos judeus é bastante esclarecedor: trata-se de uma etnia distinta formada há milênios e que, em certos períodos, formou grupos que muito se assemelhavam à imagem de nação que possuímos hoje.

Referência: SMITH, Anthony, Nações e Nacionalismo Numa Era Global, Oeiras, Celta Editora, 1999.

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