O simbolismo foi uma tendência literária que nasceu na França, com as teorias estéticas de Charles Baudelaire, e floresceu principalmente na poesia, em diversas partes do mundo ocidental, no final do século XIX. É o último movimento antes do surgimento do modernismo na literatura, por isso é também considerado pré-moderno.
Como o nome aponta, a poesia simbolista propunha um resgate dos símbolos, isto é, de uma linguagem que compreendesse uma universalidade. O poeta é, aqui, um decifrador dos símbolos que compõem a natureza ao seu redor. Contra a superficialidade material do corpo, a objetividade do realismo e as descrições animalescas do naturalismo, o simbolismo quer mergulhar no espírito, que se relaciona a algo maior, a uma instância coletiva universal, a uma transcendência.
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Resumo sobre o simbolismo
Contexto histórico
A literatura simbolista foi uma reação às correntes cientificistas e positivistas do último quartel do século XIX. A Europa vivenciava a ebulição da Segunda Revolução Industrial, que trazia consigo, além do capitalismo financeiro, as ideologias do empirismo e do determinismo. Trata-se de uma concepção técnico analítica do mundo, em que a realidade é apreendida apenas pela quantificação e análise de dados, em prol do desenvolvimento da técnica.
Havia um otimismo predominante no avanço da indústria, expresso na ideia do progresso. Os simbolistas, entretanto, percebem no surgimento das metrópoles, acompanhado da miséria, da sujeira industrial e da exploração da força de trabalho, uma decadência desesperada, uma morbidez que nada tem de progressista.
Os simbolistas questionaram as conclusões racionalistas e mecânicas em voga na época, pois elas não davam espaço à existência do sujeito, servindo apenas como combustível para a ascensão da burguesia industrial. Buscavam algo além do materialismo e além do empirismo: um sentido de universalidade, que seria recuperado por meio da linguagem poética. Buscavam, ao contrário da impessoalidade numérica e tecnológica, os valores transcendentais — o Bom, o Verdadeiro, o Belo.
Características do simbolismo
O poema “Correspondências”, de Charles Baudelaire, tem no seu próprio título a ideia central do simbolismo: a linguagem simbolista pretende estabelecer uma correspondência entre o plano material e o plano transcendental, entre o divino e o profano.
Correspondências
(Charles Baudelaire, As flores do mal, 1857, trad. Ivan Junqueira)
A evocação da espiritualidade está presente já no primeiro verso, em que a Natureza, iniciada em letra maiúscula, como uma entidade, é caracterizada como um templo vivo, ou seja, há uma vida espiritual oculta por trás da existência material das coisas. O homem cruza esse templo vivo em meio a um bosque de símbolos. E esses símbolos olham os homens com familiaridade — pois aqueles geralmente são convencionais, isto é, existem por causa de seu sentido coletivo.
O poeta fala em ecos, sons, cores e perfumes: é a presença da captação sinestésica dos símbolos. A linguagem poética é a decifradora, a que estabelece uma ponte, uma correspondência entre o mundo material e o mundo do espírito. A referência ao almíscar, incenso e resinas do Oriente também retoma essa sensibilidade sinestésica, bem como faz referência a um universo espiritual, que faz uso dessa prática aromática como contato com o transcendental.
É possível verificar as típicas características simbolistas também em Cruz e Sousa, principal expoente brasileiro do movimento:
Imortal atitude
(Cruz e Sousa, Últimos sonetos, 1905)
O poema começa com a sugestão ao sentido da visão: abrindo os olhos à Vida (também o recurso das letras maiúsculas como evocação simbólica do vocábulo), tudo se ilumina, tudo tende à transcendência. A segunda estrofe equipara a fé à sensibilidade, e despreza o aspecto material, carnal da existência, preferindo a exaltação do espírito — a alma risonha abandona “o sujo deus cornudo”, “sátiro da Carne”.
Na terceira estrofe, Cruz e Sousa passa a descrever emanações sensoriais auditivas — rugidos e gemidos da existência mortal fazem oposição ao “eterno Silêncio dos Espaços” que aparece na última estrofe, seguindo a cadência de antíteses e paradoxos simbolista.
Simbolismo na Europa
É na França da última metade do século XIX que surge o simbolismo, caracterizado por ser uma escola de “poetas malditos” e “decadentes”, boêmios, frequentadores da noite parisiense e não raro apresentando comportamentos escandalosos.
Charles Baudelaire (1821-1867)
Sua publicação intitulada As flores do mal, lançada em 1857, é considerada precursora do movimento simbolista. Sua teoria das correspondências concebe o mundo visível como uma correspondência de um mundo invisível e superior, que deve ser alcançado pelo poeta por meio de seu trabalho com a linguagem, e acabou por inspirar ou preconizar o simbolismo francês, que surgiria como movimento algum tempo depois.
A descrição etérea do poente no poema “Harmonia da tarde”, proposta de um mundo que evapora, repleto de sons e aromas e da evocação de um Universo que concebe mais do que a mera apresentação objetiva do movimento da terra em torno do Sol, é um exemplo da influência que Baudelaire exercerá na corrente literária simbolista:
Harmonia da tarde
(Charles Baudelaire, As flores do mal, 1857, trad. Ivan Junqueira)
Baudelaire escreveu também ensaios em que usou a palavra modernidade para descrever as mudanças trazidas pelo impacto do desenvolvimento da indústria em uma Europa que rapidamente transformava-se. Foi um dos primeiros autores a dar essa sugestão, chamando atenção de seus contemporâneos para a conscientização de si mesmos enquanto modernos.
É considerado um pioneiro do que depois se entendeu por modernismo, por sua tendência a desprezar aquilo que fora concebido como cultura clássica, roupa que já não servia ao seu tempo presente, efêmero, da produção e urbanização em larga escala.
Principais obras de Baudelaire: As flores do mal (1857) — poesia; Curiosidades estéticas (1869) — prosa; Pequenos poemas em prosa (1869).
Stéphane Mallarmé (1842-1898)
Autor conhecido por seu hermetismo: a complexidade do mundo que se erigia perpassa a construção de seus versos, guiados pela temática da impossibilidade e por uma busca perpétua da perfeição da forma, em constante angústia que o leva a propor jogos de composição poética, cuja genialidade foi reconhecida tardiamente.
Foi um grande influenciador das vanguardas literárias e está entre os precursores da poesia concreta, principalmente pelo poema longo “Um jogo de dados”, escrito em versos livres e em tipografia revolucionária para a época.
“Tristeza de verão”, por sua vez, é um dos diversos exemplos de textos do autor relacionados à tradição simbolista:
(Stéphane Mallarmé, 1864, trad. Augusto de Campos)
No exemplo destacam-se como elementos tipicamente simbolistas: as descrições sinestésicas do calor do sol em analogia ao incenso; a presença da morbidez da múmia em contraste com a visão solar, vital; o componente da tristeza, sinal do descompasso com o mundo contemporâneo; a temática do Nada, aspiração do esvaziamento absoluto; e o trabalho com o simbólico evocado pelos termos “azul” e “pedra” como veiculadores de insensibilidade.
Principais obras de Mallarmé: Poesias (1887); e Divagações (1897) — ensaios em prosa.
Paul Verlaine (1844-1896)
Grande influenciador do brasileiro Alphonsus de Guimaraens, Verlaine é conhecido por seus tons outonais e sua constante tentativa de conciliação entre um comportamento reprovável (o autor chegou a atirar no próprio amante, o célebre Rimbaud) e uma aspiração mística com ares de pureza transcendental.
É ele, aliás, quem propõe o termo “poeta maldito”. Além de sonetos, compôs também em prosa e em versos livres. Apesar de o poeta nunca ter se entendido como vinculado a nenhuma corrente, sua obra tem nítidos matizes da escola simbolista:
Canção de outono
(Paul Verlaine, 1866, trad. Guilherme de Almeida)
O trabalho com as aliterações dá ao poema uma musicalidade que evoca sinestesicamente o próprio som dos violões que descreve. O tom outonal, a resposta melancólica e pálida, a vida comparada a uma folha caída que voa com o vento ressoam a atmosfera simbolista.
Principais obras de Verlaine: Poemas saturninos (1866); e Os poetas malditos (1884).
Arthur Rimbaud (1854-1891)
Ícone da poesia francesa, Rimbaud recebeu influências de Verlaine e influenciou-o — os dois conheceram-se em meados dos anos 1870 e envolveram-se amorosamente, relacionamento que escandalizou a cidade à época. O caráter sensorial dos versos de Rimbaud eternizou-o canonicamente como um dos maiores poetas de seu tempo, embora tenha escrito apenas até os 20 anos de idade.
A eternidade
(Arthur Rimbaud, trad. Augusto de Campos)
A musicalidade dos versos, o trabalho com o domínio do simbólico (noite, fogo, mar, sol) e a temática da existência mortal com a dimensão transcendental da Eternidade e da alma são características do simbolismo nesse poema de Rimbaud.
Principais obras de Rimbaud: Iluminações, 1872 (poesia); e Uma temporada no inferno, 1873 (poemas em prosa).
Simbolismo no Brasil
O movimento simbolista brasileiro incorporou, grosso modo, os procedimentos composicionais do simbolismo francês. No entanto, as cenas noturnas de boemia e o epíteto de malditos são substituídos por uma literatura de tons mais religiosos e litúrgicos.
João da Cruz e Sousa (1863-1898)
Figura central do Simbolismo brasileiro, Cruz e Sousa nasceu em Florianópolis. Filho de escravos alforriados, mas, tendo participado de uma educação formal elitizada, sua obra revela uma erudição inconciliável com a situação racial de um Brasil que acabara de abolir oficialmente a prática escravista.
É a partir da publicação de Missais, livro de prosas líricas, e de Broquéis, escrito em versos, ambos publicados em 1893, que se percebe o desenvolvimento de uma estética simbolista no Brasil. Seu trabalho traz grande novidade ao procedimento literário brasileiro: aliterações, prolongamentos sonoros, rompimento com o rigor parnasiano da métrica, ressonâncias internas, entre outros.
Carnal e místico
(Cruz e Sousa, Broquéis, 1893)
“Carnal e místico” é uma sugestão da própria dualidade que os simbolistas pretendem conciliar. A imprecisão e a nebulosidade trazidas por Cruz e Sousa — bruma, diluição das perspectivas, Formas vagas — são temas característicos do simbolismo, bem como a sinestesia, evocada no “leve aroma das searas” que “todo o horizonte em derredor perfuma”, como se o autor construísse o poema com base em sensibilidades diversas. O uso das maiúsculas para dar valor absoluto a determinados termos também é um recurso recorrente do autor.
Afonso Henriques da Costa Guimarães (1870-1921)
Mais conhecido como Alphonsus de Guimaraens, o autor latinizou seu nome em 1894, intenção mística e que o aproximava dos hinos católicos dos quais tanto gostava. Quando tinha apenas 17 anos, faleceu uma prima que ele muito amava e considerava como noiva. O episódio deixou-o obcecado com a temática da morte, que tanto atravessa seus versos. Há um perene desencanto com o mundo que se traduz em lamento mórbido, e que coexiste com uma temática religiosa, litúrgica.
Em “Ismália”, talvez seu poema mais famoso, Alphonsus delineia a dualidade matéria-espírito, fazendo uso de símbolos como a Lua, o céu, o mar, o sonho, o anjo, em sugestão nitidamente simbolista. Vida e morte, real e imaginário, claridade e escuridão: os versos são feitos de antagonismos, do lado claro e obscuro da humanidade, do carnal e do transcendente:
Ismália
(Alphonsus de Guimaraens)
Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos (1884-1914)
Difícil de encaixar-se em qualquer movimento literário, estando ao mesmo tempo fora e acima disso, Augusto dos Anjos retoma de Cruz e Sousa a dificuldade de adaptar-se ao cotidiano e a estrutura de alguns versos. No entanto a novidade trazida pelo poeta, entendido por Otto Maria Carpeaux como o mais original de todos os poetas brasileiros, era a mistura de uma terminologia científica com uma obra permeada por profunda tristeza e amargura.
Perturbado por uma enorme angústia metafísica, Augusto dos Anjos aproxima-se dos simbolistas pela ânsia da unidade, da superação de todos os contrastes matéria-espírito. Escreveu um único livro, intitulado Eu (1912), e morreu prematuramente, aos 30 anos, vítima de tuberculose.
Psicologia de um vencido
(Augusto dos Anjos)
O vocabulário patológico mistura-se às aspirações místicas — elementos químicos convivem com os signos do zodíaco. O mal-estar constante e mórbido traduz-se na única resolução possível: o fim da matéria.
Exercícios resolvidos sobre o simbolismo
1) (Enem)
Cárcere das almas
(CRUZ E SOUSA, J. Poesia completa. Florianópolis: Fundação Catarinense de Cultura / Fundação Banco do Brasil, 1993.)
Os elementos formais e temáticos relacionados ao contexto cultural do simbolismo encontrados no poema “Cárcere das almas”, de Cruz e Sousa, são:
2) (PUC-Campinas)
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As estrofes anteriores, claramente representativas do_____, não apresentam _____.
Assinale a alternativa que completa corretamente AS DUAS lacunas anteriores.
a) Romantismo – sinestesia
b) Simbolismo – aliterações e assonâncias
c) Romantismo – musicalidade
d) Parnasianismo – metáforas e metonímias
e) Simbolismo – versos brancos e livres.
Resolução comentada