Famílias: não apenas um grupo, mas um fenômeno social

 

Considerando-se que a vida social é algo fundamental à existência e sobrevivência dos seres humanos enquanto indivíduos, é na família que se dá início ao processo de socialização, educação e formação para o mundo. Os grupos familiares caracterizam-se por vínculos biológicos, mas sua constituição ao longo da história em todos os agrupamentos humanos não se limitou apenas ao aspecto da procriação e preservação da espécie, mas tornou-se um fenômeno social.

As famílias são consideradas grupos primários, nos quais as relações entre os indivíduos são pautadas na subjetividade dos sentimentos entre as pessoas, fato que justifica, muitas vezes, o amor existente entre pais e filhos adotivos, logo sem relação consanguínea. Assim, os laços que unem os indivíduos em família não se sustem pela lógica da troca, da conveniência do relacionamento a partir de um cálculo racional como que em um contrato no mundo dos negócios em que cada parte vê vantagem na relação existente, constituindo um grupo formal. Ao contrário, a família é um grupo informal, no qual as pessoas estão ligadas por afeto e afinidade, e que por conta deste sentimento criam vínculos que garantem a convivência (em um mesmo local de residência, por exemplo), além da cooperação econômica.

Embora um fenômeno social presente em todas as culturas, obviamente os grupos familiares e as relações de parentesco não possuem as mesmas regras e convenções, manifestando-se de formas peculiares a depender dos costumes de um determinado povo ou sociedade. Logo, há uma relação direta entre padrões familiares de comportamento (expectativa de papel social de cada indivíduo, pai, mãe, filhos, avós, etc.) e os códigos morais vigentes, os quais também são construídos socialmente ao longo do tempo. Um exemplo claro está na forma diferente como monogamia e bigamia são vistas mundo a fora. Da mesma forma, o padrão cultural vigente vai determinar as relações de poder existentes entre os membros familiares, variando-se os tipos de autoridades existentes entre patriarcal (quando os pais de família exercem o poder de mando e controle), matriarcal (quando as mães assumem o mando) ou paternal (quando a autoridade é mais equilibrada entre os njuges).

Além disso, é importante considerar que ao longo do tempo a estrutura de organização da família pode sofrer alterações dentro de uma mesma cultura, uma vez que as transformações nos padrões familiares são consequência direta das transformações sociais, econômicas e políticas. Prova disso estaria no desenvolvimento do modo de produção capitalista, pois com a necessidade de mão de obra, criaram-se condições para a inclusão da mulher no mercado de trabalho, fato que contribuiria para mudanças em seu papel social.

O que está em declínio é a ideia de uma família composta por um casal heterossexual na qual, enquanto a mulher se restringe à esfera privada dedicando-se exclusivamente aos afazeres domésticos, ao homem cabe a esfera pública, da rua, do mundo do trabalho. Neste padrão tradicional de família, a união entre os njuges era marcada, predominantemente, pela cerimônia religiosa do casamento, independentemente da religião, fato que contrasta com as uniões muito frequentes e pouco duradoras de agora, consequência direta do temor em relação ao compromisso mais sério, principalmente pelos jovens. Também como sinal dessa reformulação dos padrões e arranjos familiares estão as famílias que se iniciam com casais homossexuais, o que acaba por gerar polêmica não apenas pelo fato da união em si (dados o preconceito e a intolerância existentes), mas também quando se cogita a adoção de crianças por eles, uma vez que no imaginário de boa parte das pessoas prevalece a ideia de uma família na qual os pais têm sexos diferentes. Nestes novos padrões familiares, além da conquista de uma maior independência pelas mulheres (em vários aspectos), elas casam-se e tornam-se mães agora com mais idade, além de terem um número de filhos extremamente reduzido quando comparado aos níveis de décadas passadas.

Dessa maneira, é importante considerar que, se a família é a base ou início do processo de socialização dos indivíduos, o que se torna fundamental é que ela seja estruturada de tal forma que o relacionamento entre seus integrantes seja pautado na harmonia e respeito entre seus pares, dada a importância e influência que tal grupo exerce na vida de cada um. Logo, ao pensar na família enquanto grupo não se trata aqui de fazer uma apologia ao modelo do passado ou ao do presente, mas de propor a reflexão quanto aos desdobramentos de sua conformação e de suas transformações, uma vez que suas características refletem a sociedade de seu tempo, o que faz dela (da família) um fenômeno social.

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