Constituição de 1891: características gerais

A Constituição de 1891 foi a segunda da história brasileira e a primeira do período republicano. Foi promulgada em fevereiro de 1891, como uma consequência direta da alteração da forma de governo. Ela implementou mudanças significativas para o Brasil, ratificando o sistema republicano presidencialista, implantando o federalismo e determinando a separação entre Estado e Igreja.

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Contexto da criação da Constituição de 1891

A Constituição de 1891 está inserida no contexto da mudança da forma de governo que o Brasil passou no final do século XIX, quando a monarquia foi substituída pela república, em 15 de novembro de 1889, por meio de um golpe. D. Pedro II e a família real foram expulsos do Brasil, e um governo provisório foi instituído sob a presidência de Deodoro da Fonseca.

A derrubada da monarquia do Brasil foi a conclusão de um processo de insatisfação que se estendeu durante décadas, período em que o pensamento republicano começou a ganhar força no Brasil. Os historiadores consideram o ano de 1870 como ponto de partida da difusão desse pensamento por conta da publicação do Manifesto Republicano.

A década de 1880 ficou marcada como um período de grande crise política no Brasil, quando se criou um quadro de polarização que acabou por minar as bases de apoio da monarquia. Grupos tradicionais que auxiliavam a sustentação do regime, como a Igreja e os cafeicultores escravocratas, afastaram-se da monarquia.

Além disso, politicamente, existia uma demanda muito grande no Brasil pela descentralização do poder. Na monarquia, o poder era centralizado no imperador e, conforme o republicanismo ganhava força, a demanda pela descentralização, isto é, a distribuição do poder em várias esferas também ganhava força.

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Toda essa crise desembocou no movimento que passou a se reunir desde 1887 para conspirar contra a monarquia. Em novembro de 1889, um grupo formado por pessoas proeminentes da sociedade decidiu colocar em ação um golpe contra a monarquia. Dias antes do golpe, convenceram o marechal Deodoro da Fonseca se juntar-se a ele.

Governo provisório

A Constituição de 1891 foi promulgada durante o governo do primeiro presidente do Brasil, o marechal Deodoro da Fonseca.[1]

Com isso, formou-se rapidamente um governo provisório que organizou a transição do Brasil monárquico para o modelo republicano. Foi um governo formado baseando-se no improviso e que, por isso, enfrentou uma série de desafios e ficou marcado pela instabilidade. Existia uma disputa muito grande na política brasileira entre aqueles que defendiam uma saída autoritária e os que defendiam a instalação de um governo liberal pautado nas liberdades individuais.

As duas prioridades iniciais desse governo provisório era o de garantir a ordem pública e realizar a substituição dos símbolos monárquicos por novos símbolos que representassem a república. No decorrer desse processo, foram convocadas eleições para a formação de uma Assembleia Constituinte que teria duas tarefas:

  1. Elaborar uma nova Constituição;

  2. Eleger um novo presidente.

As eleições foram realizadas em setembro de 1890 e, segundo o historiador Elio Chaves Flores, refletiram os grupos que estavam à frente da república brasileira. Ele categoriza em três grupos: os republicanos históricos, aqueles que apoiavam a causa desde 1870; os adesistas, aqueles que aderiram às ideias republicanas “em cima da hora” e aqueles que ainda eram monarquistas|1|.

Elio Chaves Flores ainda descreve a posição social dos membros da Constituinte, mostrando que “128 eram bacharéis, muitos dos quais filhos e representantes da classe senhorial e proprietária de terras; 55 eram militares, oriundos dos centros urbanos e dos setores médios da população; 38 eram monarquistas convictos que haviam exercido cargos na Monarquia decaída”|2|.

Estrutura da Constituição de 1891

Capa da primeira Constituição do Brasil, promulgada no dia 24 de fevereiro de 1891.[2]

Como mencionado, a Constituição de 1891 foi promulgada em 24 de fevereiro de 1891. Foi a primeira Constituição republicana do Brasil e a segunda de nossa história. Ao todo, a Constituição de 1891 contava com 91 artigos e 8 artigos de disposições transitórias, isto é, determinações que teriam validade apenas em caráter temporário.

A Constituição de 1891, enquanto instrumento que ratificou a mudança da forma de governo do Brasil, trouxe mudanças significativas para nosso país e destacaremos algumas delas. Um ponto de partida importante é que a inspiração para sua elaboração a Constituição dos Estados Unidos.

Primeiramente, a nova Constituição ratificou o republicanismo como forma de governo e estipulou que o presidencialismo seria o sistema de governo da república brasileira. O nome do país ficou decidido por “Estados Unidos do Brasil”, uma demonstração da influência norte-americana na política brasileira.

Além disso, a historiadora Maria Efigênia Lage de Resende afirma que a nova Constituição enquadrou “o Brasil na tradição liberal norte-americana de organização federativa e do individualismo político e econômico”|3|. Ela afirma também que a grande inovação da Constituição de 1891 é o federalismo, um sistema que foi implantado de maneira inédita a partir de 1891.

O federalismo é um sistema político marcado pela união de todas as federações que formam uma nação. No caso do Brasil, o Distrito Federal (União), os estados e os municípios unem-se de maneira a formar o Brasil como nação, mas, apesar de unidos, esses entes federativos mantêm cada qual a sua autonomia política.

Assim, no federalismo, estados e municípios garantiam para si grande autonomia política do Governo Federal. Esse sistema político implantou em nosso país uma grande descentralização político, uma demanda de décadas de alguns grupos da política brasileira. Essa descentralização da política deu força a uma das características mais marcantes da Primeira República: o poder dos coronéis.

Mas além disso, os estados passaram a deter “a propriedade das minas e das terras devolutas situadas em seus respectivos territórios […]. Podem legislar, também, sobre qualquer assunto que não lhes for negado, expressa ou politicamente, pelos princípios constitucionais da União”|4|. Assim, os estados garantiam autonomia para formular leis, cobrar impostos e propor diversos tipos de ações.

A implantação do federalismo, apesar de ter resultado na descentralização do poder, contribuiu para que o Brasil, durante a Primeira República, ficasse dominado pelo poder das oligarquias, grupos regionais ligados a interesses, sobretudo, de grandes proprietários rurais, que dominavam a política de nosso país, gerindo os rumos de acordo com seus próprios interesses.

Características gerais da Constituição de 1891

As transformações trazidas pela Constituição de 1891 não ficaram reclusas às questões relativas ao federalismo e à forma de governo. Com a nova Carta, o Brasil deu garantias a diversas liberdades individuais, das quais, a liberdade de reunião, de culto, de expressão, de direito à propriedade privada etc. Um avanço significativo aconteceu também com a garantia do direito ao habeas corpus.

Além disso, houve a separação oficial entre Estado e Igreja. Sendo assim, o catolicismo deixa de ser a religião oficial do Estado, impondo-se o princípio do estado laico, isto é, o Estado brasileiro colocava-se como neutro em assuntos relativos às questões religiosas. Estabeleceu-se também o princípio dos três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário.

Extinguiu-se o cargo de senador vitalício, o presidente e o vice-presidente seriam eleitos para um mandato de quatro anos, sem o direito de reeleição. Na questão do voto, impunha-se o sufrágio universal masculino, mas com algumas limitações. Na questão dos direitos sociais, a Constituição de 1891, não faz nenhum tipo de abordagem.

Leia mais: Coluna Prestes – um dos maiores movimentos de oposição da Primeira República

Regras para o voto

A Constituição de 1891 determinou o fim do voto censitário. Assim, não era mais necessário comprovar uma renda mínima para poder votar. Além disso, determinou o sufrágio universal masculino para todos os homens maiores de 21 anos, mas impedia que mendigos, analfabetos, militares de patente baixa e religiosos que faziam voto de obediência, tivessem direito ao voto.

A nova Constituição não fez menção às mulheres, o que significa que esse grupo não tinha direito ao voto. Isso demonstra que os constituintes ainda não enxergavam as mulheres como cidadãs, isto é, indivíduos dotados de direitos políticos.

A nova Constituição ainda ratificou a exclusão profunda de grande parte da população brasileira do direito de votar. Isso porque a década de 1880 ficou marcada pelo fim da escravidão no Brasil, assim, os políticos, membros e representantes das elites econômicas do Brasil anteciparam-se e acabaram aprovando uma lei que reduziu a quantidade de votantes de 10% para 1% da população|5|.

Essa lei ficou conhecida como a Lei Saraiva, sendo aprovada em 1881 e criando um cenário no qual o direito ao voto no Brasil ficou recluso a uma minoria privilegiada. Com a Constituição de 1891, o número de votantes aumentou timidamente e passou de 1% para 2% da população brasileira|6|.

O eleitor José Murilo de Carvalho, usando o Rio de Janeiro como exemplo, demonstrou que na primeira eleição presidencial, que contou com o voto direto para presidente e aconteceu em 1894, a capital do Brasil teve apenas 1,3% da população votando. Esse número aumentou para 2,5% da população, dois anos depois, e chegou a 2,7%, no ano de 1910|7|.

Um fator que afastava uma série de votantes era a violência que marcava as eleições no Brasil. O voto nessa época não era obrigatório, sendo necessário que o votante se alistasse antes da votação para poder realizar o seu voto. Além disso, o voto não era secreto, fazendo com que as eleições pudessem ser facilmente manipuladas e fazendo com que muitos dos eleitores fossem ameaçados.

O sistema eleitoral do Brasil durante a Primeira República foi extremamente conturbado. A utilização do voto de cabresto para eleger os representantes das oligarquias e outras práticas de manipulação dos resultados foram comuns durante todo o período. Somente a partir da década de 1930 que o Brasil começou a criar dispositivos para controlar a fraude eleitoral.

|1| FLORES, Elio Chaves. A consolidação da República: rebeliões de ordem e progresso. In.: FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucília de Almeida Neves. Brasil republicano: o tempo do liberalismo oligárquico: da Proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018. p. 49.

|2| Idem, nota 2.

|3| RESENDE, Maria Efigênia Lage de. O processo político na Primeira República e o liberalismo oligárquico. In.: FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves. Brasil republicano: o tempo do liberalismo oligárquico: da Proclamação da República à Revolução de 1930. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018. p. 83.

|4| Idem, p. 84.

|5| CARVALHO, José Murilo de. Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi. São Paulo: Companhia das Letras, 1987, p. 43.

|6| Idem, p. 43.

|7| Idem, p. 85-86.

Créditos das imagens

[2] Domínio público / Acervo Arquivo Nacional

 

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